Quando acabo de ler um livro, fica um vazio que urge ser preenchido. Normalmente pego em três ou quatro livros em "fila de espera" e leio as primeiras páginas para perceber qual me apetece ler nesse momento. Uma coisa rápida, indolor e eficaz.
Há simplesmente momentos e alturas da nossa vida em que o que estamos a viver e a pensar não casa com determinados livros. Tal como um encontro pode correr mal mas noutra altura poderia correr bem. Aquilo a que vulgarmente chamamos de timing.
Mas nem sempre pensei assim. Antes fazia uma cerimónia incrível com os livros, como se os seus autores estivessem a espreitar e a abanar a cabeça em sinal de desagrado perante a minha falta de empenho ou
como se as personagens ficassem ofendidas se as deixasse a meio da história. Sentia-me infiel se pensasse sequer em pegar noutro livro. E o resultado era não ler. Nem o livro que não queria nem nenhum outro qualquer que quisesse.
Mas arrisquei. Mudei o "adeus para sempre" para um "espera aí que eu já cá venho" e a minha vida literária mudou.
Dei por mim a deixar on hold livros que não me estivessem a entusiasmar por aí além e a relembrar-me deles meses ou anos mais tarde, recomeçar e lê-los entusiasmada de um fôlego. (como a frase feita : o amor está mesmo à tua frente, tu é que não consegues ver. Aconteceu por exemplo com Kafka à Beira-Mar, que resistiu meses na minha cabeceira depois de o ter abandonado. Um dia, inadvertidamente, veio-me à mente uma cena do livro e fiquei curiosa de saber o que iria acontecer a seguir. Vivi a sensação de "mas ele é tão giro, como não reparei antes?" e vivemos um bonito amor durante umas semanas)
É claro que também estabeleci a regra de que se um livro não me entusiasma mesmo nada e reviro os olhos pelo menos uma vez até à página, vamos, 50? seguimos cada um o seu caminho. Em jeito de "não és tu sou eu, talvez um dia" mas no fundo esperando que nunca mais nos cruzemos. Em inglês a expressão let it down easy é perfeita. Let it down ali ao fundo da estante, por trás de outros livros. É duro, mas assim é a vida.
E cá estou eu neste sábado carregado de nuvens a tentar decidir o próximo livro. Na mesa, e nervosos, estão Lord of the Flies de William Golding, Estrela Distante de Roberto Bolaño e A Virgem e o Cigano de D.H Lawrence. Começo por este último, simplesmente porque achava que já o tinha lido e queria confirmar. E, num ápice, acabo o primeiro capítulo. Ooops! Está escolhido, não posso negar e nem abri os outros livros. Indecente, dizem os relegados para depois entre dentes.
Lamento, pequenotes, mas o D.H. e eu vamos namorar um bocadinho. Off you go, encontrar-nos-emos quando acabar este!
E é esta a vida lasciva de um leitor.